Brasília - Ele tem o registro nacional de "O Melhor Queijo do Mundo Quinta da Cerdeira", conquistado junto ao governo português, e publicado no Boletim de Propriedade Industrial daquele país, em outubro de 2010. Meio africano, meio português, Élio Eugénio da Silva, 54 anos, nasceu em Angola e trabalha há 27 anos com turismo rural e fabricação de queijos muito especiais, o queijo da Serra da Estrela. Sua propriedade, a Quinta da Cerdeira, fica no Centro de Portugal, mais precisamente em Maceira, ao lado do Ccncelho de Seia, e juntinho ao ponto mais alto daquele país, a Serra da Estrela, a 300 km de Lisboa.
Naquela região belíssima, com flora, fauna e vistas para ninguém botar defeito, e onde a neve cai entre os meses de novembro e abril, Élio produz artesanalmente o queijo da Serra da Estrela, cremoso por dentro e durinho por fora. Queijo feito de leite de ovelha da raça bordaleira, com sabor característico e único, em vários formatos: triangular de 150 gramas, para facilitar a vida de quem não necessita de grande quantidade; redondo, de 700 gramas, 1kg, 1,5 kg e, acreditem, de até 30 kg,este último feito por encomenda.
Inovação é uma das características de Élio, que agora está produzindo o creme do queijo da Serra da Estrela – feito com o miolo do queijo - e também produz requeijão que pode ser servido como pasta. Com a ajuda da irmã, Regina Silva, também angolana, ele faz os queijos – a produção é de 10 mil kg, por ano – vendidos na região, em Lisboa e exportados, em pequenas quantidades, para França, Espanha, Suíça, Bélgica, Inglaterra, Holanda e Alemanha. Contudo, a produção ainda é maior do que a demanda e Élio espera novos clientes, especialmente da África e do Brasil, regiões pelas quais tem paixão.
A história de Élio Eugénio da Silva tem trajetória de luta, perseverança e resistência. Seus pais, Joaquim da Silva, nascido em Seia, Portugal, e Adriana Pires Santos, nascida em São Tomé, São Tomé e Príncipe, casaram-se em Angola, em 1958. Joaquim tinha 28 anos e Adriana 21 anos. Tiveram cinco filhos: Regina, Élio, Sérgio, Adelaide e Carla, todos angolanos, que vivenciaram o dia-a-dia da guerra pela libertação daquele país. Quatro meses antes da independência de Angola, como 500 mil portugueses, denominados "os retornados", fugiram do país em um voo oferecido pelo governo de Portugal para voltarem às terras lusitanas.
"Não tínhamos condições de continuarmos, já que três movimentos de libertação estavam em guerra contra o exército português pela independência e pelo poder em Angola", explica Élio. Era o ano de 1975, e a família – fugindo de uma guerra civil, entre as três facções - chegou a Portugal. "Viemos para um país onde meu pai tinha nascido e crescido, mas que nós não conhecíamos. Enfrentamos dificuldades, chegamos com uma mão à frente e outra atrás". Élio tinha 13 anos de idade e logo começou a trabalhar com o pai em uma fábrica de lanifícios, mais tarde fechada como muitas outras empresas do ramo em Portugal. Sempre com a garra de querer trabalhar e vencer, aceitou outros ofícios, em Lisboa e até na França, onde trabalhou na colheita de uvas e de maçãs, ofícios que lhe proporcionaram novas experiências e desafios.
Em 1989, Élio comprou a Quinta da Cerdeira e reconstruiu a casa e instalações, e a transformou em uma pousada, que hoje oferece sete quartos com suíte, em ambientes ventilados, aconchegantes e bem decorados, com oferta de pequeno almoço e refeições. Montou a queijaria que atende às exigências da fiscalização da saúde e que possui máquinas específicas em temperaturas baixas para manter a qualidade do leite e dos queijos, coalhados com a flor de cardo, sem química, e feitos a partir de uma receita ancestral passada de geração para geração. "Gosto de Portugal, mas sinto muitas saudades de Angola, das frutas, das pessoas, da cultura", explica.
No início, a família – um casal e os filhos pequenos – enfrentou também preconceitos. "Viemos para uma aldeia, onde as mentalidades são mais fechadas. Achavam que deveríamos ter ficado em Angola, mas apesar de tudo a integração não foi difícil", comenta. Hoje, duas irmãs de Élio vivem em Lisboa, onde trabalham. O pai e o irmão Sérgio são falecidos. Uma das irmãs e a mãe vivem em Maceira e ele na Quinta, rodeada de flores nativas, de muito verde e em um clima agradável, de ovelhas que transitam com seus sininhos, de noites em que se veem quantidades infinitas de estrelas e onde se tem uma hospitalidade ímpar para quem gosta da Natureza, do sossego, de bons queijos e vinhos, e de paz e tranquilidade.